Empreendedorismo















A trajetória de Oscar Americano de Caldas Filho e de seus empreendimentos expressa o entrelaçamento de valores de formação, aptidões e práticas que, por décadas, contribuíram para melhorar a qualidade de vida de pessoas e comunidades em diferentes regiões de São Paulo e do país.
Seu pai, Oscar Americano de Caldas, por volta de 1897, aos 21 anos de idade, montou uma empresa e começou a trabalhar com demolição, calçamento de ruas e instalação de redes de água e de esgoto em São Paulo e cidades vizinhas. Atuou, ainda, em obras sob a orientação de seus dois cunhados, engenheiros bem-sucedidos e de grande prestígio: Miguel Frederico Presgrave (1869-1933) e Manoel Guimarães Carneiro (1870-1927). Para além das atividades públicas que exerciam e das empresas que comandavam, ambos eram consultores e fiscais de obras da célebre Companhia City, a City Improvements & Company, que, nas primeiras décadas do século 20, foi responsável pela projeção e urbanização de vários bairros na capital do estado. Assim, em 1899, Oscar Americano de Caldas tornou-se assistente dos engenheiros-chefes da Companhia City nas obras de renovação das represas de Cubatão, que abasteciam a cidade de Santos.
Décadas depois, a dinâmica do desenvolvimento começava a redesenhar a cidade. Apesar do cenário econômico abalado pela Grande Depressão, decorrente da quebra da Bolsa de Nova Iorque em 1929, e do panorama politico brasileiro, que atravessava o conturbado ano de 1930, São Paulo já́ apresentava o potencial do parque industrial que, em pouco tempo, viria a ser o mais importante do país. A própria expansão, no entanto, acentuava algumas imperiosas carências. No campo da saúde pública, por exemplo, tornava-se evidente a falta de instalações apropriadas para o tratamento de doenças infectocontagiosas. Um dos primeiros estabelecimentos a surgir com essa finalidade foi o Sanatório Miguel Pereira, conhecido como Hospital do Mandaqui, na zona Norte de São Paulo, em 1938. O Mandaqui prestou assistência médica pioneira aos tuberculosos em São Paulo, contribuindo decisivamente para as políticas públicas de saúde na cidade.
Separadas por quatro décadas, a construção do Hospital do Mandaqui e as obras da Hidrelétrica de Itaipu, nos anos de 1970, estão ligadas por um traço comum: a história da empresa inicialmente batizada como Escritório Técnico Oscar Americano, fundada em 1931 pelo então jovem engenheiro Oscar Americano de Caldas Filho e seu pai. A partir de 1933, já como Companhia Construtora Oscar Americano, a empresa começou a destacar-se entre as pequenas construtoras de obras públicas. Além do Sanatório Miguel Pereira, construiu, na mesma década, vários trechos de estradas de rodagem e de ferro no interior de São Paulo. Havia então uma frota de cerca de 70 mil veículos no estado, entre automóveis e caminhões, e a questão do transporte era eminente.
Nos anos de 1940, a trajetória da empresa seria marcada por acontecimentos determinantes. Tão logo terminou a Segunda Guerra Mundial, Oscar Americano foi aos Estados Unidos em busca de conhecimento sobre as inovações em curso. Estava consciente de que o Brasil caminhava para um período de grande desenvolvimento e que necessitaria impreterivelmente de muito mais infraestrutura, como rodovias, ferrovias, indústrias e obras de base, bem como de que os métodos construtivos utilizados em terraplenagem teriam de ser reformulados com base em nova tecnologia. Já era tempo das carroças puxadas por mulas, movendo menos de um quarto de metro cúbico de terra por vez, serem substituídas definitivamente por equipamentos automatizados.
Ao visitar as construtoras norte-americanas, Oscar constatou que o setor de construção no Brasil não aproveitava adequadamente seu potencial de crescimento, sobretudo por falta de arrojo na política de investimentos e nos métodos administrativos. Voltou com disposição para reestruturar a empresa e investir no treinamento dos seus integrantes. Na bagagem, trouxe o contrato de uma importação de equipamentos bastante significativa. Eram tratores, caminhões e outras máquinas pesadas, desenvolvidas para uso militar nos campos de batalha, mas que tinham sido desativadas com o fim da guerra.
Essa importação, que pode ser caracterizada como o primeiro grande salto tecnológico da empresa, começou a transformar o cenário nos canteiros de obras e mudaria também o ritmo dos trabalhos, permitindo que a Companhia se habilitasse para construções de maior porte, como a Via Anchieta, na ligação de São Paulo a Santos. Em 1949, houve a mudança do nome da empresa para Companhia Brasileira de Pavimentação e Obras — CBPO.
Como consequência da crescente industrialização nos anos de 1950, o governo acelerou os investimentos de infraestrutura no transporte de cargas e de passageiros. Inicialmente, seria contemplada principalmente a malha ferroviária. Já na segunda metade da década, quando as grandes montadoras de automóveis e caminhões se preparavam para disputar o mercado brasileiro, as verbas eram liberadas principalmente para a construção de rodovias. Para a CBPO, o momento não poderia ser melhor – sua participação nesse processo foi das mais expressivas.
No entanto, nem só ́de rodovias vivia a empresa. Além de levar seus canteiros de obras a diversas cidades do interior de São Paulo, beneficiando muitas comunidades, a CBPO esteve presente em um grande empreendimento na capital: a urbanização do Morumbi, hoje uma das regiões mais prestigiosas da cidade.
A CBPO foi a primeira empresa a abrir um loteamento onde, na época, existiam somente sítios e fazendas. Hoje há, no Morumbi, além de muitas residências, a Fundação Maria Luisa e Oscar Americano, o Palácio do Governo do Estado de São Paulo, o Hospital Albert Einstein – um dos mais conceituados da América Latina –, o Hospital Infantil do Morumbi – idealizado por Oscar Americano –, a sede social e o estádio do São Paulo Futebol Clube e, ainda, uma associação recreativa que ganhou o nome lançado pela CBPO: Clube Paineiras do Morumbi, fundado em 1960 e que ocupa uma área de quase 100 mil metros quadrados.
Plenamente consolidada como uma empresa para grandes obras de terraplenagem e pavimentação, a CBPO decidiu partir para um desafio ainda maior: construir barragens e usinas hidrelétricas. Seguindo uma bem elaborada estratégia, começou participando, na qualidade de subcontratada, nas obras da Usina Hidrelétrica de Três Marias. Depois, foi conquistando projetos maiores e acabaria sendo uma das escolhidas para participar de Itaipu, tornando-se uma das principais construtoras a contribuir para a implantação do sistema de geração de energia elétrica no país. Para marcar decisivamente essa nova fase, a empresa alterou seu nome para Companhia Brasileira de Projetos e Obras, mantendo a sigla CBPO. A palavra projeto, no lugar de pavimentação, expressava o horizonte mais amplo de sua atuação no campo da construção civil.
Nos anos de 1970, quando o Brasil entrava no dito período do “milagre econômico”, com taxas recordes de crescimento do Produto Interno Bruto — PIB e com início de grandes obras em diversos setores, a CBPO já́ fazia parte do time das principais empresas de construção pesada do país.
Desse modo, participou das obras públicas mais importantes da época, como o Aeroporto do Galeão e o Metrô do Rio de Janeiro, a Rodovia dos Imigrantes e o Anel Rodoviário de São Paulo – batizado de “Cebolão” –, a Ferrovia do Aço, a Rodovia Belém-Brasília, além de Foz do Areia e outras grandes usinas hidrelétricas.
Em junho de 1974, a CBPO foi abalada pela morte de Oscar Americano, aos 66 anos de idade. Ele sempre esteve diretamente no comando da empresa e nunca deixou de procurar novas frentes de negócio e oportunidades de crescimento para a construtora. Um ano antes, ele realizara mais uma empreitada arrojada. No dia 8 de março de 1973, a CBPO era declarada vencedora da concorrência pública internacional para construir a Barragem de Yguazu e a Central Hidrelétrica de Acaray II, no Paraguai, tornando-se, assim, uma empresa internacional.
Com a morte de seu fundador, Mário Pimenta Camargo torna-se presidente da CBPO, e Aluízio Rebello de Araújo, seu vice-presidente. Esse momento coincide com a construção do Aeroporto do Galeão, na qual a empresa participava ao lado da Construtora Norberto Odebrecht — CNO. A convivência no canteiro de obras e o envolvimento no mesmo projeto mostraram que as duas empresas poderiam ter aspectos comuns e, em 1980, ambas decidiram unir suas potencialidades.