Paineiras do Morumbi











São Paulo
A cidade de São Paulo, em meados do século 19 – cerca de 300 anos depois de sua fundação, em 25 de janeiro de 1554 – ainda não passava de uma rústica vila colonial. Parte significativa de seus 25 mil habitantes dedicava-se a hortas domésticas no Vale do Anhangabaú e morava em casas de pau-a-pique e taipa.
O destino de São Paulo, na segunda metade daquele século, tomaria um novo rumo com o cultivo do café, que se tornou o principal item de exportação do Brasil, imprimindo extraordinário ritmo de desenvolvimento ao estado. Os grandes fazendeiros transferiram-se para a capital e relevantes obras públicas alteraram definitivamente o perfil da velha província. Do exterior, chegaram milhares de imigrantes. Em 1897, eles constituíam população maior que a dos brasileiros residentes na região.
Ao completar 400 anos, em 1954, São Paulo já possuía o maior parque industrial da América Latina.
Há, na história da cidade, protagonistas que foram decisivos para consolidar o crescimento econômico e social da principal metrópole da América do Sul, como o engenheiro Oscar Americano de Caldas Filho (1908-1974).
O rápido desenvolvimento na segunda metade do século 20 levou à expansão da cidade para novas áreas, entre as quais, a conhecida pelo nome de Morumbi. Nas décadas de 1930 e 1940, a localidade ainda pertencia ao município de Santo Amaro e era ocupada por chácaras e pequenas fazendas, distante do que seria a São Paulo da época.
Paineiras do Morumbi
Entre 1940 e 1943, o arquiteto Oswaldo Arthur Bratke, em sociedade com Noé Ribeiro, adquiriu algumas terras adjacentes à antiga Fazenda Morumbi. A primeira aquisição correspondia a cerca de quatro alqueires e era denominada Lote 44. No início, essas áreas serviram como chácara de veraneio e lugar para experimentos de sistemas construtivos e painéis modulares.
Bratke dizia que, nos primeiros tempos, para ir com sua família até a propriedade, era preciso estacionar o carro bem distante dela e seguir de charrete, atravessar uma pequena ponte de madeira e iniciar a subida do Morro do Morumbi, para, então, através das picadas, alcançar a chácara.
Hugo Segawa conta que a localidade foi palco de animado convívio entre arquitetos e artistas. Frequentaram-na Kenzo Tange e Walter Gropius, com quem Bratke trocava cartas e croquis. Sérgio Milliet foi inquilino da chácara a partir de 1942, dividindo o aluguel com o pintor Francisco Rebolo Gonçalves, que ali morou entre 1946 e 1955 – período em que pintou as famosas paisagens do Morumbi. A chácara foi o lugar onde artistas – em especial, o Grupo Santa Helena – faziam suas divertidas reuniões de fim de semana.
Consciente do potencial da região no pós-guerra, em 1946, Oscar Americano de Caldas Filho comprou cerca de 61 lotes na região, vizinhos à chácara do amigo Oswaldo Bratke. Na mesma ocasião, arrematou outros terrenos, totalizando 107.409 metros quadrados. Nos anos seguintes, continuou a adquirir extensas áreas próximas à sua propriedade.
Amigo de longa data, Bratke estimulou Oscar Americano a pensar na urbanização da região, cujo delineamento deveria ser inspirado nos bairros-jardins. Amplos lotes residenciais, unifamiliares, com restrições quanto a recuos e ocupação foram então esquadrejados em amplas quadras irregulares, acomodadas ao relevo movimentado. O sistema viário, à exceção da já existente avenida Morumbi, serpenteou as colinas mantendo declividade amena, possibilitando que Oscar Americano experimentasse o maquinário que recentemente importara. A máquina fundia em peça única guia e sarjeta, caracterizando, posteriormente, todo o perímetro do bairro – a novidade foi documentada à exaustão. Segundo Hugo Segawa, a área hoje conhecida como Paineiras do Morumbi poderia ser reconhecida observando-se o contínuo meio-fio de concreto das ruas, executado in loco por meio de um procedimento construtivamente veloz.
Ao planejarem o bairro que denominaram Paineiras do Morumbi, Oscar e Oswaldo objetivaram implementar conceitos inovadores de morar. Projetaram equipamentos institucionais, comerciais e áreas livres públicas para uso recreativo, no intuito de agregar valores do viver a áreas extensas, relativamente próximas ao centro da cidade. O novo bairro deveria ter ao menos dois centros comerciais, um clube comunitário e uma escola de nível superior. Diferindo da visão idílica e romântica do campo como isolamento na natureza, os amigos intencionavam promover a ideia de uma vida saudável em ambientes de maior leveza, em que fosse possível cultivar hábitos esportivos e sociáveis – moderno era viver bem.
Para dinamizar o empreendimento urbanístico, Oscar Americano vendeu os primeiros lotes de terreno para amigos em condições acessíveis, atrelando ao contrato o compromisso de construção em período inferior a dois anos. Como estímulo, em 1955, o próprio Oscar se mudou com a família da região do Jardim América para o experimental Morumbi.